sexta-feira, 16 de julho de 2010

Pensamentos de um Mito (XXIII) – Muito mais que um Mundial

Finalmente! Após sucessivas edições onde a qualidade do espectáculo andou por níveis mínimos, o Mundial de Futebol conseguiu resgatar em terras Africanas (alguma) da magia que em tempos o caracterizou e lhe garantiu um lugar no imaginário dos adeptos deste desporto maravilhoso. Conseguiu-o até de forma atípica: se a norma é termos fases de grupos animadas - pois a margem de erro permitida é superior – e posteriores jogos “a matar” dignos de bocejo, desta vez deu-se o Inverso! Quase todas as equipas entraram no mundial a medo e uma vez concluída essa primeira fase a qualidade do espectáculo disparou para níveis dignos de uma “Champions”. Gerações vindouras de adeptos irão visionar jogos como o Alemanha-Inglaterra, o Holanda-Brasil ou o Alemanha-Argentina e irão arregalar os olhos.

Sim, este Mundial assinala um ponto de inflexão, mas não apenas na qualidade do espectáculo…. Nunca mais poderá a FIFA assobiar para o lado de cada vez que lhe recordarem a importância da inserção das novas tecnologias no Futebol como auxílio à arbitragem. Que o Sr. Blatter perceba uma vez por todas que vedando aos árbitros estes meios não está a defender o futebol e sim a defender uma mentira! Estamos a falar em lances concretos – nomeadamente aferir se a bola transpôs ou não a linha de golo e se um jogador está ou não “fora-de-jogo” –, e que ao não dependerem de “critério” algum (ambos são pura questão geométrica - sim ou não; está ou não está) em nada beliscam a autoridade do árbitro em campo. Pelo contrário, além das injustiças acabava-se de vez com estas discussões, e os árbitros poderiam finalmente ser julgados por aquilo que realmente importa: a sua capacidade na condução de um desafio.

Também a Alemanha será, doravante, olhada com outros olhos. De monstros “físico-tácticos” passaram a monstros “físico-técnicos” capazes de trocar as voltas às linhas defensivas adversárias e onde sobressaem (sobretudo) 3 nomes: Neuer, Muller e Ozil. O primeiro deixou de ser uma promessa e colheu o testemunho da dinastia dos grandes guarda-redes germânicos como Sepp Maier, Harold Schumacher ou Oliver Kahn. Thomas Muller é um Panzer que dinamita toda a frente de ataque (isso sim, partindo sempre desde uma das faixas). A sua juventude faz-nos pensar até onde poderá chegar e a sua ausência na meia-final facilitou em muito a vida da Espanha. De Ozil – quiçá a grande revelação deste mundial - o melhor que posso escrever é que faz questão de honrar o seu sangue Turco a cada drible, a cada arrancada e a cada controlo de bola naquele jeito tão próprio dos futebolistas que possuem um corpo franzino. Também ele colhe o testemunho de um dos últimos grandes jogadores germânicos e com o qual partilha as origens: Quem se recorda de Mehmet Scholl?

No lado oposto do espectro situam-se Selecções como a Itália, a França e a Inglaterra, pois têm forçosamente de alterar o modo como olham… para elas mesmas. A Itália nunca se soube definir (e assumir) como candidata à revalidação da coroa e pagou por erros surreais. Se antes do mundial alguém disse-se que a ITÁLIA iria entrar em todos os jogos a perder e a ter de correr atrás do resultado diriam que o Mundo estava virado de pernas para o ar. Para azar dos Italianos, estava mesmo, e não era por estarmos em África.

A Inglaterra, cujo jogo tão forte parecia em vésperas da competição sofreu um Blackout tão grande que jogadores como Rooney e Lampard pareceram (e foram) de uma vulgaridade atroz. Ironicamente, no único jogo em que revelaram espírito e (em parte) talento para dar a volta por cima, foi a vez de o árbitro auxiliar sofrer um Blackout e roubar um golo a Lampard perante a incredulidade do mundo inteiro.

A França, de entre as referidas, foi a que teve a pior prestação porque permitiu que desde o início o escândalo (envolvendo a vida privada de algumas das suas principais figuras) e uma liderança que realmente nunca existiu ditassem as regras. Quando uma Federação não protege a equipa nacional, quando um treinador não lidera (nem treina..) e quando dentro de campo não há uma figura respeitada capaz de unir o grupo então não há nada a esperar de ninguém.

Falar da Espanha, inédito Campeão Mundial, é falar de uma história que começou com Cruijff e dos frutos de bom futebol que semeou na sua passagem pela Catalunha (e que agora, sob a mão de Guardiola atingiram a maturidade plena, para gáudio de Vincente Del Bosque), dos jogos Olímpicos de Barcelona em 1992 (que iniciaram um investimento no Desporto ao qual todos os governos Espanhóis posteriores - todos - deram seguimento) e que agora conhece o seu capítulo mais feliz. Campeões da Europa e do Mundo em Futebol (e não só…), a vitória da Espanha é a vitória da Formação como principal motor para a obtenção de resultados. Este é o espelho para o qual todas as Federações se irão “mirar” nos próximos anos.

Dos seus jogadores não há nada a dizer pois todos nós os conhecemos e sabemos do que são capazes. Sim, começaram hesitantes; sim, demoraram a demonstrar bom futebol; sim, ganharam demasiados jogos pela margem mínima; mas quando chegou a hora de todas as decisões (meias-finais e final) recuperaram a memória do seu futebol e venceram sem discussão possível.

E Portugal? Creio que na análise à prestação da nossa Selecção há várias coisas a reter, algumas a reflectir e outras tantas a esquecer, mas essa é uma análise que deixarei para o próximo “Pensamento”. Decidi dedicar o presente artigo somente aos factos e figuras que maior impacto causaram neste Mundial, pelo que em jeito de conclusão não posso esquecer esse heróico Uruguai do não menos heróico e talentoso Forlán (depois da Temporada que realizou, tivesse vencido este Mundial e endossavam-lhe a Bola de Ouro). Ambos despertaram o orgulho adormecido de um País que ostenta desde há largas décadas o título de Bi-Campeão do Mundo.

Glória aos Vencedores. Saibamos aprender com eles.

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