Em pleno ano de 1991, deu-se aquela que muitos consideram ser a conquista mais significativa do desporto nacional em geral, e do futebol português em particular. Em Lisboa, no saudoso Estádio da Luz do mítico terceiro anel e perante um infernal mar de 127 mil espectadores, os Sub-20 lusitanos sagravam-se bicampeões do mundo da categoria, batendo na final - através do desempate por grandes penalidades - o Brasil de Roberto Carlos, Élber e Paulo Nunes. Nascia assim a lenda da "Geração de Ouro" que consagrou nomes como Luís Figo, Rui Costa e João Pinto, jogadores que até então possuíam pequena expressão no futebol internacional, mas que a partir desse marco construíram as suas carreiras.
Nessa mesma competição e no meio de tantos promissores jogadores de inegável talento, destacou-se um incansável médio defensivo, pedra essencial na manobra de transição defesa-ataque da selecção das quinas. As suas exibições de carácter crucial para a caminhada vitoriosa de Portugal na prova, valeram-lhe a distinção de melhor jogador do Mundial de Sub-20, e augurava-se um grande futuro para este jovem jogador que na altura actuava de leão ao peito. No entanto, o que se veio a constatar foi um dos maiores "flops" da história do futebol português. Este é o relato da ascensão e queda do filho pródigo que as praias da Nazaré viram nascer, de seu nome, Emílio Peixe.
O campeonato do mundo de sub-20 revelou um Peixe que apesar de jovem, possuía grande cultura táctica, um posicionamento no campo praticamente sem falhas, e uma rapidez de pensamento e execução de movimentos impressionante. Carlos Queiroz, o seleccionador que conduziu a selecção nacional à conquista do troféu, via em Peixe o elemento essencial para conseguir libertar em todo o seu esplendor a criatividade ofensiva de Rui Costa.
Com o estatuto alcançado através da representação de grande qualidade ao serviço das cores nacionais, aliada à distinção com a Bola de Ouro para melhor jogador da competição, Peixe era um jogador bastante bem referenciado, e foi com grande expectativa que fez a sua passagem de júnior para sénior. Ao serviço do Sporting cedo conquistou um lugar na equipa titular, rubricando exibições de alto nível que lhe valeram em 1995 a transferência para o Sevilla Fútbol Club.
Como em outros casos de transferências precoces e inadaptações ao futebol local, Peixe nunca se conseguiu impor na formação sevilhana. E ao fim de poucos meses em Espanha, foi sem surpresa que decidiu regressar ao berço do leão. Desiludo por essa experiência mal sucedida e com os níveis de confiança em baixo, as seguintes épocas em Alvalade revelaram-se inconstantes, oscilando constantemente em termos de forma exibicional. Em 1998, o internacional português entrou em rota de colisão com os dirigentes leoninos, e após meses sem jogar, abandonou o clube de Alvalade de forma conflituosa. O Futebol Clube do Porto foi a casa que o acolheu - juntamente com Costinha, por troca com Bino e Rui Jorge - num dos famosos negócios de trocas de jogadores da altura, uma espécie de "Rota Alvalade-Antas".
Não obstante, a sua vida ao serviço dos azuis e brancos não foi mais fácil. Relegado maior parte das vezes para o banco de suplentes, nunca conseguindo superar a concorrência de Doriva e Paulinho Santos, Peixe viu maior parte da época fora das quatro linhas. Até que uma janela de oportunidade surgiu com a venda do médio brasileiro e a lesão grave de Paulinho Santos.
Peixe é chamado a titular e na sua estreia frente à União de Leiria marca um golo memorável, um longo chapéu do meio campo à aproveitar o excessivo adiantamento do guardião leiriense após uma débil reposição da bola em jogo. Esse golo de antologia valeu-lhe uma condição de estado de graça entre o povo do Dragão.
Porém, essa elevação seria efémera e com os primeiros jogos da nova temporada Peixe volta a perder o conforto do onze titular e é novamente encaminhado para a fria realidade do banco de suplentes. Descontente com a situação, comete o maior erro que um "empregado" do FC Porto pode cometer: entrar em divergências com Pinto da Costa. Essa imprudência, aliada à intempestiva relação com o seu empresário da altura José Veiga, fez com que fosse castigado e expatriado para a equipa B , saindo apenas no final de 2001 para o Futebol Clube de Alverca.
Teve ainda uma breve passagem pelo primeiro Benfica de Camacho, no Verão de 2002, onde nem chegou a calçar, sendo que na época seguinte e ao serviço da União de Leiria, colocou um terminus na sua carreira.
Apesar de ter passado pelos três grandes do futebol português, a caminhada de Peixe foi caracterizada por uma linha descendente. A inadaptação a Espanha e consequente regresso precoce a Portugal. Os inúmeros conflitos com dirigentes dos respectivos clubes onde actuava, e a associação a agentes desportivos que o condicionaram, são apenas alguns dos pontos que podem explicar o mergulho profundo que Peixe deu no imenso mar do anonimato e esquecimento.
Não é Portista quem quer, só é Portista quem pode
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