A vontade de vencer - FC Porto na Champions

1 - Está prestes a iniciar a nova edição da Champions League, a competição principal do futebol europeu a nível de clubes. O Porto, pela 15ª vez, está presente entre os melhores da Europa do futebol, numa competição em que tem pergaminhos de luxo.

Esta é a competição que entusiasma verdadeiramente o adepto de um clube como o FC Porto. Uma competição verdadeiramente à altura de um clube como o nosso, em que os casos dos jogos são, na maior parte das vezes, não o penalty que ficou por marcar nem a má actuação do árbitro tal, mas sim o golo mágico ao minuto x, a jogada do jogador y no fim da primeira parte, a maneira como as equipas se bateram, etc. Enfim, a diferença entre o futebol jogado entre grandes clubes e um campeonato em que existe um grande clube e mais umas quinze equipas de mentalidade pequena em que aquelas que chegam às competições europeias não se livram de pelo menos uma humilhação todos os anos. Que bom é ser do Porto e poder ver a minha equipa jogar nos grandes palcos europeus, ser reconhecida no seu lugar de gigante europeu... Que alegria as terças e quartas-feiras de jogos internacionais, e que contraste com a macilenta palidez do fim de semana desportivo nesta terra em que as emoções são falseadas pelas primeiras páginas de jornais desportivos que vendem banha de cobra a adeptos sedentos da glória que lhes falta...

2 - O Porto, como afirmei no parágrafo anterior, pela sua história, organização, mística, entre tantas outras qualidades, é um clube diferente do panorama português, um clube grande que joga entre os grandes. Um clube que não deve ter medo de enfrentar ninguém. Mete-me por isso, aqui deixo uma confissão pessoal, confusão quando vejo perante o sorteio da Champions reacções tão cautelosas perante os adversários que nos calharam em sorteio. Vi o sorteio em directo e sou sincero: quando sabia já que Chelsea e Atlético eram os clubes que nos acompanhavam antes de começar o sorteio do pote 4, desejei o Wolfsburgo, o campeão alemão. Quem me estiver a ler julgar-me-á, certamente, louco, suicida, se calhar pouco conhecedor do mundo do futebol. Posso ser um pouco disto tudo, mas também aprendi a ser ambicioso com este clube. Aprendi a acreditar que ser portista é poder esperar o melhor. É aprender a sonhar com grandes feitos. E uma coisa também aprendi desde que vejo, e desde quase que começou a competição, o Porto na Champions: quando nos sai um grupo fácil claudicamos. Parece que caímos para um facilitismo que nos derrota em campo. Quanto maior o grau de dificuldade, mais eu acredito que o Porto passa a fase de grupos. Mais eu creio neste clube. Lembro-me de o sorteio ser risonho várias vezes ao Porto e sairmos em Dezembro da competição sem honra nem glória. Exemplos? Época 98/99, em que na fase de grupos o Porto apanha um Ajax já sem o brilho de outros tempos, um Dinamo Zagreb perfeitamente ao alcance de uma equipa média e o Olympiacos. Ficamos em terceiro, sem honra nem glória. Época 2005/06: Rangers ao alcance e um desconhecido Artmedia Bratislava põem Porto em último lugar do grupo. Quando se pensava que o primeiro e segundo lugares eram para Inter e Porto, o inimaginável (ou as invenções de Adriaanse, treinador de má memória) colocam Porto no último lugar com uns miseráveis cinco pontos ao fim dos seis jogos. E os exemplos não se esgotam aqui. Basta lembrar os exemplos da época 95/96 aos comandos de Robson e a época 97/98 com Oliveira.

Com estas memórias, sempre desejei que nos calhassem em sorteio equipas que seriam autênticos desafios. Que pusessem os jogadores a entrar em campo sem facilitismos. A saberem que têm que dar o litro para poderem vencer adversários de renome. Nos últimos três anos, com Jesualdo Ferreira, o Porto habituou-se a jogar no limite do sacrifício. Quando ganhar foi inevitável o Porto conseguiu-o, como aconteceu o ano passado em Kiev, jogo em que já ninguém acreditava na vitória. Ou então, dois anos atrás, as vitórias fora seguidas contra o Hamburgo por 1-3 e a vitória por 0-2 na fria Moscovo contra o CSKA.

3 - Assim, pessoalmente, gostei do sorteio da Champions, do calendário que nos calhou e estou convencido que o Porto passa o grupo. Começamos já daqui a semana e meia em Londres contra o Chelsea, equipa de estrelas cheias de garra. O Porto tem poucas hipóteses de pontuar, é certo. Mas é positivo começar com o jogo mais difícil, em que não teremos que pensar mais. Mas num passado recente já quase não o conseguimos fazer algo bonito em Londres? Quem não se lembra em 2006/07 do golo de Quaresma que nos pôs a sonhar ao intervalo com a eliminação do clube de Abramovich, na altura treinado por Mourinho? E das dificuldades que lhes criamos? E a verdade é que os golos que acabaram por ditar a vitória aos londrinos foram dois frangos de Helton, um dos actuais pontos fracos do Porto que precisa de ser rapidamente revisto. Mesmo que o Porto perca no próximo dia 15, o jogo seguinte é em casa, contra um Atlético de Madrid capaz do melhor e do pior. Tanto mostra um ataque fortíssimo como uma defesa permeável, que não se aguentará certamente com uma locomotiva chamada Hulk pela frente. Sendo em casa, o Porto terá que ter as despesas do jogo. E perante o seu público certamente dará uma alegria aos adeptos que encherão o estádio no dia 30 deste mês. Como deu ainda esta ano civil ao eliminar o Atlético nos oitavos.

Segue-se a dupla jornada com o APOEL, o campeão cipriota. A missão só pode ser uma: ganhar seis pontos nos dois confrontos, com respeito pelo adversário mas jogando à Porto. Esta dupla jornada poderá ditar a nossa sorte para passar o grupo, até porque o nosso adversário "directo", o Atlético, joga dupla cartada com o Chelsea. Seguem-se os jogos em casa com o Chelsea e fora com o Atlético. Nesta altura, esperando ter a equipa mais entrosada e moralizada, será importante jogar bem em casa contra os ingleses e pontuar (recordamos que a regra é as equipas inglesas não ganharem no Dragão, apesar da excepção criada pela Manchester na época passada) e talvez já ir a Madrid qualificados. Assim eu acredito que possa acontecer.

4 - É verdade que a equipa do Porto é nova, que está em construção. Saíram duas peças fundamentais do xadrez portista, Lucho e Lisandro, e também Cissokho. Se este último parece ter em Álvaro Pereira um substituto à altura, mais difíceis são as substituições dos dois argentinos. Belluschi ainda não está na forma prometida. Varela e Falcao ainda são diferentes de Lisandro e estão em adaptação. Mas no passado o Porto também soube responder face às ausências de indiscutíveis, muitas vezes com jogadores que os fazem esquecer, caso de Fernando que matou logo as saudades de Assunção. Estamos no começo de época, e o Porto no campeonato revela algumas debilidades. Mas a Champions é diferente, é uma competição em que os jogadores se auto-motivam e dão o tudo por tudo. Por isto, também, acredito que o Porto mais uma vez vai, depois do fim da fase de grupos, juntar o seu nome outra vez no firmamento dos grandes da Europa, lugar que lhe tem pertencido por direito. Que os jogos da grande competição europeia de clubes comecem, e com eles as emoções que fazem dela uma prova única (apesar de algumas modificações ridículas do francês Michel Platini, brilhante jogador mas que deixa a desejar como presidente da UEFA).

5 - Duas breves notas para finalizar. Nem só de futebol se faz o nome do FC Porto: Domingo, no Estoril, Álvaro Parente (portista assumidíssimo) corre na Superleague Formula, prova automobilística, com as cores do nosso clube. Força Álvaro! Em qualquer modalidade em que o símbolo do clube dos Dragões apareça é para o apoiar e esperar ganhar.

A outra nota é sobre a Selecção, que ontem hipotecou de vez as aspirações ao Mundial. É urgente rever muita coisa na Federação, desde o topo até ao Seleccionador. Queiroz não mostrou mais uma vez pulso para liderar um grande projecto. Existe em Portugal um mito Queiroz que não se entende. Um treinador não pode continuar a colher os louros de duas vitórias mundiais pelos sub21 à vinte anos atrás. Não será altura de pensar numa nova alternativa?