quinta-feira, 18 de junho de 2015

Justa Causa para Marco Silva

Alguns leitores habituais destas crónicas solicitaram-me por e-mail esclarecimentos sobre a situação atual de Marco Silva. A resposta não é fácil de dar sem se conhecerem em concreto os factos invocados pelo Sporting/SAD no processo disciplinar. A avaliar pelos que tem vindo soprados nos pasquins parecem-me mais de natureza subjetiva do que objetiva. Como se comprova a “falta de solidariedade institucional”? Ou a “desobediência ilegítima às ordens da entidade patronal”? Será por não ter colocado Rojo em campo para ver se a Sad o conseguia despachar mais depressa? Ou a “inobservância das regras de conduta próprias da atividade e das necessárias à disciplina no trabalho”? Por exemplo o treinador “não treinar os cantos mais vezes” ou “cheirar mal dos pés”? Outra das acusações dizem ser a “ lesão de interesses patrimoniais sérios”! Quais? Ter ganho “apenas a Taça de Portugal e não conseguir a entrada direta na Champions”? Se foi por isso os treinadores dos outros clubes todos que se cuidem!
Na falta dos dados da nota de culpa vamos então analisar os procedimentos legais.
 
Segundo a opinião do Dr. José Manuel Meirim, “não havendo um regime específico para treinadores de desporto, o mais normal será que este caso seja visto à luz das normas do Contrato Coletivo de Trabalho e do contrato de trabalho do praticante desportivo pela sua proximidade, e não tanto do Código de Trabalho, em nome da especificidade daquela relação e da sua aproximação à dos treinadores.” In PÚBLICO
 
Sendo assim, o empregador pode aplicar as seguintes sanções, devendo ter sempre em conta a proporcionalidade entre a gravidade da infração disciplinar invocada e a pena.
 
a) Repreensão;
b) Repreensão registada;
c) Sanção pecuniária;
d) Suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade;
e) Despedimento com justa causa
 
Devem ter-se em conta os conhecidos termos “como, quando, e onde”.
 
É que o procedimento disciplinar deve iniciar-se nos 60 dias subsequentes aquele em que o empregador teve conhecimento da infração. Para isso deverá ter um registo atualizado das sanções disciplinares, feito por forma a permitir a verificação do cumprimento das disposições aplicáveis, nomeadamente por parte das autoridades competentes que solicitem a sua consulta. Daqui se deduz que, em princípio, quaisquer que sejam os factos invocados pela SAD, só deverão ser consideradas as infrações ocorridas nos dois últimos meses. Se quem julgar o processo o fizer segundo o contrato de trabalho de praticante desportivo, este prazo reduz-se para 30 dias.
 
Depreende-se contudo que nas anunciadas 400 páginas que contém as fundamentações para o despedimento a SAD anda a fazer a cama ao treinador desde o início da sua contratação. Este facto, já de si estranho, pode jogar a favor do treinador, e levar o juiz do processo a considerar por parte da SAD, litigância de má-fé.
Os prazos que a lei consagra para as partes dizerem de sua justiça são 10 dias já decorridos por parte do treinador que apresentou a sua defesa, mais 30 dias para o relator contrapor ou aceitar. Se achar que a argumentação não satisfaz, o caso segue para Tribunal, e aí não há prazos fixados para a marcação do julgamento, sentença, e eventuais recursos das partes. Marco Silva, embora continuando a ser considerado como trabalhador (suspenso) da SAD está, na prática, impedido de exercer a sua atividade durante largo tempo. Daqui não será de excluir que se lhe for dada razão, além dos salários que tenha direito a receber até ao termo do contrato, poderá acrescentar a competente indemnização por danos morais e materiais.
 
Mais complicado mas para abreviar uma solução, Marco Silva também poderá revogar o seu contrato por mútuo acordo, prescindindo duma eventual indemnização a que tenha direito, ou rescindir com justa causa alegando até alguns dos factos invocados pela SAD. A “falta de solidariedade institucional” vinha mesmo a calhar.
Continua no próximo capítulo.

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