sábado, 6 de julho de 2013

Faltou "Coragem" à geração "Talento".

 
Portugal terminou a sua participação no Mundial sub-20 aos pés de Gana, 3º classificado no grupo A da competição. Um rival claramente inferior em termos de talento à selecção portuguesa.
  • Posto isto, o que falhou a esta talentosa geração?
Obviamente que a resposta ínsita no titulo deste texto é redutora. Não faltou apenas coragem. Faltaram disciplina táctica, rigor, concentração e liderança técnica, táctica e estratégica. Faltou treinador para aprimorar esta geração, colocar os talentos ao serviço de um colectivo coeso e organizado.
 
Relativamente à geração anterior, esta geração apresentava mais experiência competitiva, graças às equipas B. Alguns dos jogadores são já opção em equipas da 1ª liga, no caso de Bruma e Ilori são mesmo titulares de um clube como o Sporting.
 Portugal nesta competição partia como um dos favoritos, posição reforçada pelo facto das duas grandes potências Argentina e Brasil não estarem em prova, e por ter um dos maiores talentos desta categoria: Bruma.
 
O problema é que só o talento não chega. Fazendo a comparação entre esta geração e a anterior, repara-se que uma selecção consegue chegar mais longe sendo uma equipa, sabendo esconder limitações através de um espírito colectivo coeso, e de uma liderança forte, do que fiando-se apenas no talento dos seus intérpretes esquecendo-se de se organizar, pensar e respirar em campo como uma equipa.
 
Tiago Ferreira, o único sobrevivente da Geração Coragem, talvez pudesse ter dado alguns conselhos aos colegas acerca do espírito e da capacidade competitiva que uma geração muito menos talentosa e tão pouco valorizada pelo seu próprio país, teve há dois anos.
 
Porventura, a falta de coragem não pode ser imputada directamente aos jogadores. Começa na estrutura federativa e passa pela equipa técnica liderada por Edgar Borges.
Edgar Borges tem como saldo ao serviço da federação, duas qualificações para o europeu de sub 19 mas sem conseguir passar da fase de grupos em ambas as ocasiões. Neste contexto e já com esta equipa, Edgar Borges também deixou escapar a oportunidade de ganhar o Europeu de sub-19 sendo eliminado na fase de grupos em que se encontravam as duas finalistas: Espanha e Grécia.
 
Se a qualidade dos adversários até poderia servir de atenuante, o mesmo não se poderá dizer da desconcentração da equipa que chega à última jornada precisando apenas de empatar com a Grécia e perde a cabeça logo de início tendo um jogador infantilmente expulso, condenando assim a selecção ao insucesso e acabando por ser eliminada, num jogo em que o empate lhe bastava.
 
Como prémio por esse insucesso, a Edgar Borges foi-lhe dada a oportunidade de se manter ao leme desta talentosa geração de jogadores. Geração que tem ainda a vantagem de poder apresentar uma espinha dorsal de jogadores que brilharam todos ao serviços dos juniores do Sporting, sendo campeões nacionais e brilhando numa competição que é uma espécie de liga dos campeões de sub 19.
 
Em sentido contrário, Ilídio Vale, uma velha raposa, e provavelmente um dos maiores nomes da formação em Portugal - cujo mérito nem sempre lhe é reconhecido por não se colocar em bicos de pé-é afastado da selecção nacional sub-20 sendo mandado para a prateleira depois de ter logrado um feito fantástico, levando Portugal a um final de um mundial onde parecia condenado por todos a ir apenas para fazer número.
Tal como na nossa formação enquanto estudantes, temos a possibilidade de trocar de professores quando damos um passo na evolução académica ( do ensino primário para o básico, do básico para o secundário e do secundário possivelmente para o superior), a esta geração lhe faria muito bem ter um novo “professor”. E quem melhor que o mestre Ilídio Vale? Principalmente tendo a possibilidade de apresentar uma autoridade sobre estes atletas reforçada, por ter sido o comandante de uma equipa vice campeã mundial.
 
Ilídio Vale pegou num grupo de jogadores com pouco ritmo de competições profissionais, sem muitas soluções e soube colocar as peças e fazer uma verdadeira equipa, que demonstrava uma concentração competitiva que parecia enganar o bilhete de identidade
  • Á geração talento, sobraram velhos vícios que se perpetuaram com o mesmo treinador: Edgar Borges
Muitas desatenções defensivas (não por falta de opções de qualidade para o sector defensivo, mais por falta de concentração colectiva), um problema crónico de falta de intensidade no momento da transição defensiva e na capacidade de vencer as bolas disputadas, principalmente a meio campo, com jogadores de qualidade técnica superior, mas com pouca intensidade.
 
Contudo, como ponto forte esta selecção apresentava uma enorme vocação e capacidade ofensiva. Uma equipa muito criativa, com um meio campo passivo defensivamente, mas com jogadores de enorme capacidade de passe, um lateral direito de excelência, como João Cancelo e um desiquilibrador que marca as diferenças como Bruma.
 
Edgar Borges com isto tudo não fez o que se espera de um treinador. Não potenciou o bom e escondeu o mau. Claramente Edgar Borges não soube ler os sinais, o que é grave para quem acompanha estes jogadores há alguns anos.
 
Portugal entrou no primeiro jogo contra a Nigéria a todo o gás, marcando dois golos e dando um festival de futebol ofensivo. Demonstrou depois a sua pior face quando consentiu o empate dos nigerianos, mas ainda assim acabou por vencer no final.
 
Uma característica desta equipa. Uma equipa que gosta de jogar para a frente, que pensa principalmente no momento ofensivo, e que se desconcentra e é pouco intensa quando perde a bola, e que tem dificuldade em guardar resultados, porque no seu adn está a procura constante do golo.

Edgar Borges entendeu que o segredo para compensar os erros defensivos, seria mexer na estrutura ofensiva da equipa. Equivocou-se enormemente, porque nem a equipa passou a defender melhor, como ainda se sentiu claramento condicionada naquilo que era o seu ponto forte, a organização ofensiva e as transições ofensivas.

Logo no jogo com a Coreia do Sul, Edgar Borges decidiu retirar Cancelo para colocar Oscar Dabo um lateral direito menos ofensivo, para assim poder supostamente atacar com menos jogadores.

Portugal na mesma colocou-se em vantagem, na mesma deixou-a fugir, mas a diferença é que jogou pior, atacou menos, teve menos iniciativa e acabou mesmo por empatar, quando com outra atitude e soltando a equipa mais para o jogo, teria ganho o jogo. Com Cuba, voltou uma estrutura ofensiva normal, a explorar os corredores laterais e a assumir mais o jogo e veio uma goleada.
  • O jogo com o Gana
Para o jogo com o Gana, já a eliminar, eis que Edgar Borges demonstra a tal falta de “coragem”. Como uma velha escola de treinadores portugueses, preferiu deixar a coragem toda nas palavras na sala de imprensa ao dizer que não se chateava que o resultado fosse 10-9 para Portugal...
 
Já no campo a mensagem para os jogadores foi totalmente distinta. Decide colocar Ié a lateral direito. Uma opção a fazer lembrar uma de Queiroz no Mundial da África do Sul em que coloca Ricardo Costa a lateral direito tendo dois laterais de raiz no banco. Resultado? Derrota e golo marcado pelo lado justamente do lateral adaptado.
 
Esta mania de alguns treinadores, que reforçar a defesa com um central adaptado a lateral é a fórmula mágica para se defender melhor. Pelo contrário. Um central não conhece as rotinas do posto, tem dificuldades quando tem que fechar por dentro, já para não falar que não sabe como se posicionar em organização ofensiva e muito menos tem a capacidade para dar largura e aparecer a cruzar.
 
Edgar Borges passou basicamente para a equipa a mensagem de que não confiava neles no momento defensivo e que por isso deveriam mudar a sua forma de jogar para não sofrer golos. Assim decidiu amputar o lado direito de Portugal, que deixou de poder carrilar jogo, pois Edgar Ié obviamente não consegue dar a dinâmica ao flanco que dá um João Cancelo.
Mais grave ainda é Edgar Borges decidir prescindir de um dos maiores destaques do Benfica B e desta geração. Passou a barreira do incompreensível quando mesmo a perder Edgar Borges, faz duas alterações ao intervalo mas nenhuma delas incluía a entrada de Cancelo que assistiu do banco Portugal a dar a volta ao jogo (de 0-1 para 2-1) para depois acabar em menos de 15 minutos por sofrer dois golos em falhas graves da defesa. O do empate, curiosamente pelo lado onde defendia Ié…
 
Edgar Borges puxou o freio ofensivo de uma equipa que não sabe defender, e que a sua melhor defesa seria exactamente colocar o pé no acelerador e atacar e dominar os jogos, para que pudesse marcar mais golos do que sofrer.
 
Edgar Borges tinha um problema a meio campo por ter jogadores como João Mário, André Gomes ( que só se lembrou de aparecer no Mundial no último jogo) e Agostinho Cá, que privilegiam mais a posse de bola, e que não são dados a grandes correrias atrás da bola.
  • O que fazer?
Assumir o jogo. Ter bola. O que fez a Espanha quando começou a fabricar jogadores como Xavi, Iniesta, Fabregas e companhia, que gostam de ter a bola no pé em vez de correr atrás dela? Começaram a jogar em posse, pois jogar um jogo partido em constantes transições seria incómodo para as características que a Espanha tem.

Edgar Borges não soube conciliar o futebol de transições através de Bruma, para um futebol mesclado, capaz de ter a bola e sem que por isso tenha que deixar de acionar Bruma em momento de transição.
 
O problema na defesa não era dos jogadores da defesa, nem se resolveria se jogassem com 4 centrais em cima da linha de golo. Era um problema colectivo, que devia ter sido corrigido a começar pelo ataque.
Trata-se de características dos jogadores. Se temos um meio campo pouco pressionante, então devia ter sido colocado Ricardo Esgaio a extremo. Esgaio faz todo o corredor, começou a sua formação como lateral e ainda pode jogar a interior direito. Daria a rapidez e dinâmica necessária em momento da perda da bola e organização defensiva, podendo ajudar no momento da recuperação da bola, libertando Bruma no flanco contrário.
 
Outro jogador que claramente saiu negligenciado desta competição e que poderia ter sido aproveitado para solucionar alguns dos problemas colectivos foi Tozé do F. C. Porto.
 No Porto b jogou a extremo, mas é um médio interior, que é rápido, tecnicista, mas que tem muita garra e que não desiste de uma bola. Um médio que poderia muito bem aparecer no onze ou por troca com André Gomes, ou até mesmo por Ricardo Dias/ Agostinho Cá, recuando André Gomes ou João Mário no terreno. Daria maior nervo ao meio campo da equipa e ainda a capacidade de remate de longa de distância.
 
Edgar Borges também não foi inteligente ao estar constantemente a variar entre duplas de centrais. Tiago Ferreira, Ilori e Ié, são 3 potenciais titulares, é um facto. A vida de Edgar Borges no euro sub-19 ficou mais tranquila em termos de decisão com a lesão de Ié que assim lhe fez não ter outra opção que não escolher a dupla Ferreira/ Ilori.
Neste Mundial com o regresso de Ié, faltou a Edgar Borges a coragem para optar por uma dupla e dar-lhe confiança ao longo do torneio. No jogo com o Gana deu a ideia que para não ter que optar, e para sentir que estaria mais seguro atrás, escolheu jogar com os três centrais, pensando que assim defenderia melhor.
 
Para isso, abdicou do lado direito da equipa durante todo o jogo, tentando depois compensar com a entrada de Esgaio por Ricardo, mantendo contudo Ié a lateral.
 
É o problema de coragem da estrutura federativa. Coragem para não recompensar a incompetência e coragem para se livrar de tradicionais porreirismos e compadrios. P. Bento é seleccionador e o amigo Rui Jorge vai para seleccionador sub-21. Resultados? Nada. O que se faz em relação a isso? Nada.
Nos sub-20, optou-se por mandar Ilídio Vale para a prateleira para dar continuidade a Edgar Borges.
 
Infelizmente nunca saberemos como seria uma geração com este talento, nas mãos de um treinador que com muito menos conseguiu muito mais. O que sabemos é que nesta fase de amadurecimento competitivo, faria bem a Bruma, Ilori, André Gomes e companhia, um treinador que lhes desse bons ensinamentos sob o ponto de vista táctico, de organização defensiva e que fosse capaz de criar um espírito de grupo forte.
 
Se calhar esta federação não merece profissionais como Ilídio Vale. Enquanto assim for, pode haver muito Talento, faltará sempre a Coragem.

 

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