sábado, 17 de agosto de 2013

A saída de Castro ou a forma como se tenta apagar o jogador à Porto...

 
 O empréstimo de Castro ao Kasimpa da Turquia devo admitir que caiu como um balde de água fria, num certo entusiasmo que vinha tendo em relação à política de contratações do Porto para esta época.
 
Um ano em que se parecia apostar novamente no mercado nacional e no aproveitamento de jovens portugueses como Licá, e jogadores adaptados ao nosso campeonato como Ghilas, ou ainda o recuperar de jogadores da casa que haviam sido dispensados, como Josué. Contudo, aquilo que parecia ser uma inflexão a uma política que optava sistematicamente por apostar em mercados estrangeiros, sofreu um rombo grande.
O conceito do jogador à Porto nos dias de hoje levaria a muita discussão. Já não será possível voltar a ter jogadores portugueses formados na casa como nos anos 80 e 90, a lei Bosman é um dos motivos mas não só.
 
O futebol assumiu-se como uma indústria, um negócio. Já não se fala de jogadores, fala-se de activos, já não há uma ideia de continuidade. Já não existe uma relação exclusiva clube-jogador. O empresário veio abalar por completo o vínculo emocional que ligava um atleta a um clube. Hoje em dia falar de futebol é falar de contratos, de fundos, de cláusulas, de comissões. Perdeu-se um certo romantismo.
O jogador à Porto não morreu. Alterou-se. Hoje em dia podemos considerar João Moutinho que foi formado num rival um jogador à Porto apenas pelas características técnicas e de carácter que coloca em campo. Fala-se de uma forma de estar, de característica algumas delas inatas, que fazem com que um jogador à Porto possa inclusive ser um estrangeiro como Lucho Gonzalez que chega e se acultura e depois vai passando a mensagem para os novos que chegam.
Castro é um jogador à Porto puro. Daqueles que não são fabricados, ou trabalhados. Está-lhe no sangue. O bisavô foi jogador do Porto. Castro é portista nascido e criado, que percorreu todos os escalões de formação do clube. Ele sofre cada derrota não como um profissional. Sofre como um portista como o mais apaixonado dos adeptos. Nos dias que correm em que parece ser impossível falar de amor à camisola, um jogador como Castro é a possibilidade de devolver algum romantismo à fria máquina da tão elogiada “estrutura”.
O enésimo empréstimo de Castro por tudo isto e por outros motivos, tem uma simbologia superior ao que se pode previamente perceber. Não é apenas mais um jogador que é emprestado. Trata-se do Porto, clube, e não sociedade, não gestor de activos, não entreposto de jogadores para grandes campeonato, abdicar de um pouco de romantismo. De um pouco de sentimento. Castro passou anos em sucessivos empréstimos, onde sempre deixou excelente impressão, começando no Olhanense e passando pelo Gijon onde deixou excelente imagem, pautando as suas exibições por tudo aquilo que reconhecemos ser as características de um jogador à Porto. Competência, paixão, raça, dedicação e entrega total. Castro saiu para crescer, mas sempre deixando claro que o fazia para um dia realizar o sonho de vestir a camisola que sente ser um prolongamento da sua própria pele. A camisola do clube pela qual ele sofre e que ama.
O Porto a isso respondeu com tímidas tentativas de o incluir no plantel nos trabalhos de pré-época mas sem lhe dar a real hipótese de ser alternativa. Com Villas Boas realizou o sonho de fazer parte do plantel, mas logo para ser emprestado a meio da época. O ano passado parecia ter sido o ano de Castro. Vítor Pereira abriu-lhe as portas do plantel, fez dele opção para alguns jogos e Castro respondeu sempre muito bem, demonstrando que para além de tudo é um jogador capaz de transportar a mística portista e é um jogador que faz bom balneário e que não faz birras a pedir mais minutos, coloca os interesses do clube à frente das suas ambições pessoais.
 
Esta época o Porto perde Moutinho, contrata Herrera por uma pequena fortuna, mas traz ainda Tiago Rodrigues, Carlos Eduardo e traz Josué.
 
Josué parecia ser um sinal do Porto a dar a mão à palmatória por ter deixado sair um jogador da casa que provou ter qualidade para fazer parte do plantel. Josué juntar-se-ia a Castro e finalmente vislumbraríamos aquilo que deveria ser a concretização do afamado projecto visão 611 que previa incluir alguns atletas formados no Porto na 1ª equipa. 
Durante a pré época P. Fonseca demonstrou confiar em Castro e fez dele um dos jogadores com mais minutos. Um dos jogos em que o reformulado meio campo melhor funcionou foi exactamente contra o Galatasaray em que Castro jogou a titular e rubricou uma excelente exibição. Castro partia também na poule position para ser um dos capitães de equipa. Um núcleo duro interessante de jogadores como Lucho, Helton e o regressado Fucile. Jogadores com muitos anos de casa e que podiam passar aos novos o que representa ser jogador do F. C. Porto.
 
Havia alguma abundância de opções para o meio campo, contudo Castro nunca havia sido colocado em causa até há cerca de uma semana. Os sinais da pré época foram claros, Carlos Eduardo pouco tempo jogou, e pouco mostrou. Tiago Rodrigues se jogou 5 minutos na totalidade foi muito. Falava-se na possibilidade de Tiago Rodrigues sair para rodar no Guimarães (algo totalmente lógico), e que Carlos Eduardo corria riscos, até pelo pouco tempo de utilização.
Qual não é a surpresa quando vemos depois nos últimos tempos os jornais a passarem a notícia que apesar de pouco ter jogado que Carlos Eduardo tinha a garantia de ficar no plantel…Esse foi para mim o primeiro sinal, que uma vez mais a fava saíria a Castro. O tal jogador que se sacrifica pelo clube e que por isso não faria como Rolando e não colocaria entraves a uma saída desejada pelo clube. Não levantaria ondas, algo que à administração dava um certo jeito.
 
E assim aconteceu. Castro prejudica a sua carreira desportiva, ao ir-se esconder numa equipa turca que não disputará as competições europeias e ainda ficando o clube com direito de opção sobre o jogador o que só demonstra que o Porto efectivamente não valoriza Castro como jogador. Não valoriza o aquilo que pode dar ao clube e a sua qualidade. O que pretende apenas é despachar um activo, e ganhar dinheiro com ele. No fundo trata Castro como um jogador qualquer. Não um jogador que carrega a mística do clube e que merecia ser tratado com o mesmo carinho que os adeptos lhe dispensam.
Mesmo para a carreira do atleta, nota-se que o Porto pouco se preocupou. Garantiu-lhe estabilidade económica mas condenou-o a ficar bem longe da hipótese de ir ao Mundial do Brasil. Podia tê-lo emprestado a um clube espanhol, uma liga onde Castro já jogou e valorizou-se, mas optaram por negociar com um clube turco que já havia recebido Djalma.

Esta cedência é a prova da falência e da hipocrisia do projecto visão 611. Onde está a preocupação do clube em promover os jogadores da casa?

Seria assim tão impossível voltarmos a ter jogadores portugueses formados no clube como no passado com: Baía, Domingos, Fernando Couto, Jorge Costa etc?
Muitos arautos dizem que o clube tem é que ganhar e que os jovens não têm qualidade suficiente?
Tal argumento cai por terra quando o Porto teve a espinha dorsal de uma equipa campeã da Europa de sub-17. A geração de 2003 campeã da Europa em Viseu tinha como máximas referências: Márcio Sousa, P. Machado, Bruno Gama, Vieirinha e Hélder Barbosa. Tudo jogadores do Porto. O que aconteceu a esses jogadores? O mesmo que está agora a acontecer a Castro. Sucessivos empréstimos a clubes com pouca dimensão, até ao ponto que nunca deram o salto competitivo para chegarem à dimensão que prometiam chegar.
 
Por outro lado, custa ver que dessa mesma geração, Moutinho que era suplente, acabou contratado por 10M e foi apelidado de jogador à Porto. É mais fácil reconhecer um jogador à Porto quando ele está fora de portas...?
Moutinho se tivesse sido formado no porto, nunca chegaria a ser chamado de jogador à Porto nem seria o melhor médio português da actualidade. Porquê? Porque nunca teria a oportunidade sequer de ser opção no plantel. Porque tem opções de muita qualidade a taparem-lhe o lugar? Nem por isso. Titulares sim, mas é assim tão complicado pedir que no banco estejam jogadores do clube, que recebem menos e têm um vínculo emocional, do que jogadores estrangeiros que nunca se afirmarão como titulares?
 
Vieirinha e Hélder Barbosa não tinham lugar no banco porque ele era ocupado por “talentos” do nível de Djalma ou Mariano Gonzalez…
P. Machado foi o primeiro Castro. Outro médio capaz de ocupar três posições, polivalente, raçudo, portista até ao tutano, mas que na fase decisiva da carreira andava perdido em sucessivos empréstimos. Um empréstimo pode ser interessante na formação de um jogador. Mas quando eles são condenados a sucessivos empréstimos sem qualquer tipo de critério ou preocupação o normal é acabarem por passados vários anos saírem do clube sem nunca terem tido uma real chance de afirmação.
Curioso ver que com tantos anos de atraso, foi preciso toda essa geração de sub-17 sair do Porto a título definitivo para percorrerem um longo caminho que os levou à selecção. Vieirinha e Paulo Machado primeiro, Helder Barbosa já por lá passou e agora té Bruno Gama. Todos contudo viram a sua carreira congelada em anos fundamentais para afirmação. Todo o contrário do que aconteceu com Moutinho ou Veloso.
Infelizmente podemos dizer que hoje em dia, para o bem do futebol português, é melhor que os jovens talentos não estejam vinculados ao Porto, porque nesse caso acabarão por se perder após anos de empréstimos sem a mínima esperança de serem opção para o plantel. O mais revoltante é sentirmos que não se trata de uma decisão puramente desportiva. É negócio. Entre um jogador do Porto, nascido e criado, e outro de qualidade semelhante ou inferior mas que seja estrangeiro e tenha sido contratado, opta-se pelo estrangeiro.
O caso de Castro é sintomático. O treinador confiou nele durante toda a pré-época. Devemos mesmo acreditar que foi P. Fonseca que decidiu emprestar Castro…? Se confiava tanto nos demais médios, porque não os colocou a jogar?
 
A decisão não é desportiva. Quem conhece o plantel, quem trabalho no dia-a -dia sabe que Castro merecia ficar no plantel. Poderiam ter dado ouvidos ao próprio João Moutinho que na saída confrontando com a sua sucessão, disse que o Porto tinha o Castro e que por isso não teria que se preocupar...Se treinadores, colegas e adeptos sentem que Castro é jogado à Porto e para ficar no Porto, porque é que a direcção acha diferente? Quais são os motivos?
 
Infelizmente estamos perante um caso que não é apenas técnico táctico. Falamos de empresários, de comissões, de favores que se pagam mais cedo ou mais tarde. Falamos de dinheiro.
 
Castro é português, não tem porventura o empresário certo, e não gera mais valia em comissões de transferência como outros elementos do plantel que o integraram não apenas pela sua valia técnica ou porque o Porto deles necessitava.
O mais curioso será ver que o Porto até ao final de Agosto ainda poderá perder Fernando. Contudo, nem pensou duas vezes e deixou sair Castro que é dos poucos jogadores do plantel que pode fazer a posição de Fernando. O que acontecerá se Fernando sair? O Porto provavelmente irá contratar mais um médio, isto mesmo tendo a solução dentro de casa.
 
Parece-me claro que numa estrutura de 3 médios o Porto teria que ter um mínimo de 6 jogadores no plantel. Fernando/Defour, Herrera/ Josué e Lucho / Quintero. Acontece que destes 6, Quintero só pode jogar a 10. Destes 6, Defour deve ser titular no lugar que pertencia a Moutinho. Sendo assim que jogador sobraria para entrar no lugar de Fernando se necessário? Herrera? Ele já disse que é um 8, e ainda está a adaptar-se ao futebol europeu. Castro era a solução óbvia. Um jogador que pode jogar nas duas posições do triângulo invertido do meio campo do Porto para esta época.
Castro é portista, é competente, é português, é formado na casa, é mais barato que outras soluções, faz bom balneário e é um jogador que se sacrifica pela equipa. Fez o que lhe competia e depois de uma boa época, fez uma excelente pré época enquanto que Carlos Eduardo ou Tiago Rodrigues pouco ou nada mostraram. Sendo assim porque sai Castro? Uma explicação que infelizmente não a teremos porque não é algo que os jornalistas perguntem.
 
Em conclusão ficam as declarações de Castro quando esteve emprestado no Gijon demonstrado que aquilo que deve ser o seu estado de espírito, mas que infelizmente o Porto parece não estar muito importado:
 
«Andar emprestado já não faz sentido. Quando acabar a época terei 24 anos. Tenho de me afirmar. Tenho feito boas épocas quando sou emprestado, tanto no Olhanense como no Sporting, e agora algo tem de se decidir. Não se trata de uma exigência, mas não é bom andar sempre emprestado. Nunca sabemos onde vamos estar na época seguinte»,
 
Castro parte agora para Turquia com 26 anos e sem garantias de voltar, aparentemente o Porto até agradecia que não voltasse para receber 6 milhões por um jogador à Porto, espécia em vias de extinção e que devia ser preservada. Pelos vistos será algo apenas para ser visto no futuro museu do clube…
 

2 comentários:

JOSE LIMA disse...

Um artigo muito bom, Ricardo, como é seu timbre. Se bem se lembra, como dizia o outro, discutimos isso em Espinho a propósito do que é “ser um jogador à Porto”.
Há muitos, muitos, anos, tivemos uma grande escola (era no mesmo sitio do Dragon Force, na Constituição, claro). O Professor chamava-se Artur Baeta. Foi o primeiro treinador que pôs os laterais a subir. Jogava-se com 3 defesas, dois médios e cinco atacantes, com os “interiores” a fechar atrás, quando os laterais subiam. Uma espécie de WM. Ganhávamos tudo que havia para ganhar nos escalões jovens. Recordo-me do último jogo de um campeonato que já estava ganho antes da última jornada, onde, para prémio aos jogadores, fomos disputar essa partida de consagração no estádio das Antas contra o Sporting. Ao intervalo ganhávamos por 4 ou 5 a zero. E sabe o que o Baeta fez? Na segunda parte, apresentou a mesma equipa mas com uma diferença: os 5 jogadores da frente passaram para as posições defensivas e os defesas e médios foram para a frente do ataque! Resultado: Fizemos mais 4 ou 5 golos. Quer isto dizer que já naquela altura havia a ideia de cada jogador se enquadrar num sistema de jogo desde as camadas jovens até aos seniores. Aquilo que agora se pensa fazer para a equipa “B”.
Sem discordar de nada do que o amigo disse, só lhe recordo que a formação tal como hoje se processa, é caríssima e por vezes sem grandes resultados à vista. Sabe qual foi o azar do Castro desta vez? A chegada de excelentes médios: Josué, Herrera, Licá e especialmente Quintero. Se lhes somarmos Fernando e Lucho, lá estão os 6 que precisamos.
Outro factor que desilude bastante na entrada dum jogador da formação para a primeira equipa, é não ter êxito imediato. Os responsáveis do nosso clube, e dos outros todos, querem resultados imediatos. Preferem apostar num jogador já feito mas que dê garantias. Bem sei que, por vezes, apanhamos com cada “Baroni”…
Um abraço

Ricardo Costa disse...

Obrigado pelo excelente contributo caro José Lima.
Realmente este tema já tinha sido discutido por mim em Espinho e na época até utilizei Castro como exemplo do derradeiro jogador à Porto no sentido mais romântico.
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O seu testemunho acerca do trabalho que se fazia no passado na formação do Porto pela mão Artur Baeta é de uma enorme riqueza e a questão que coloca em relação ao presente é pertinente.
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Se o Porto não tem por política apostar na prata da casa, fará sentido os custos e projectos apresentados como o visão 611?
Eu considero que pela sua grandeza e dimensão social o Porto forma profissionais e homens mesmo que estes depois não tenham espaço no plantel principal.
Contudo, tal como referi em Espinho, a formação do Porto tem qualidade, mais do que a que se comenta, porque pode não colocar muitos jogadores no plantel principal mas o Porto é o clube que mais jogadores tem na 1ª e 2ª liga por si formados.
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Ou seja, parece-me que o problema está mesmo na política desportiva que estrangula totalmente a hipótese de jovens atletas como: Castro, Vieirinha, P. Machado, Bruno Gama e companhia gozarem das mesmas oportunidades que noutros tempos tiveram Vitor Baía, Domingos, Fernando Couto ou Jorge Costa.
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Opta-se pelo negócio, pela comissão, por jogadores que não são melhores que os que já cá temos mas que são essenciais para que o fluxo financeiro continue a bombar no seio da SAD.
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Assim vai-se abdicando aos poucos desse tal jogador à Porto clássico e é necessário importa-los de outros clubes.
O Porto por vezes sofre de miopia. Prova disso é este regresso de Josué que foi formado no clube mas que já havia sido dispensado. Foi preciso estar na eminência de fugir para o Sporting para o Porto o resgatar.
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Sobre o nº de opções a meio campo só discordo que Licá seja uma delas. Licá será adaptável às três posições do ataque.
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O Porto optou por manter Tiago Rodrigues que vai andar a rodar pela b, tal como Carlos Eduardo e preferiu deixar cair Castro que nunca teve uma oportunidade real de disputar o lugar. E sempre que chamado respondeu bem. Ao ponto do próprio Moutinho o apontar como seu sucessor...

Um abraço.